E mais uma vez eu me odeio. E odeio cada parte de mim por
ser o que eu sou. Odeio olhar no espelho e ver alguém que antes teria se
detestado. Uma pessoa mesquinha, egoísta e cruel. Cruel, acima de tudo. Eu
odeio pensar que acabei com ele, literalmente. Odeio ver o coração dele se
despedaçar cada vez que olha para mim, odeio porque o meu se despedaça cada vez
que olho para ele. Odeio cada segundo desse ódio, dessa culpa, que comprime meu
peito e que aperta tanto que chega a doer. É como se o ar não existisse, como
se nada mais existisse, muito menos sentido. É um buraco sem fim, é ser eu sem
mim, inexistir numa existência inútil. Eu odeio e amo cada memória, porque cada
uma delas está impregnada com você e, consequentemente, com a culpa de ser eu,
de ser tão pouco como você. Eu me detesto um pouco mais a cada dia e desapareço
dentro de um personagem perfeitamente criado por mim. Eu finjo e não canso de
fingir, como se sem o fingimento eu fosse menos real. Na verdade, não sei o que
é real, perdi a noção de realidade, perdi a noção de mim, me perdi e não
consigo me encontrar.
- Mariana Siqueira